Streptococcus beta hemolítico do grupo B: guia completo sobre prevenção, diagnóstico e tratamento na gravidez. Saiba como proteger seu bebê da infecção com orientações de especialistas brasileiros.
O que é Streptococcus beta hemolítico do grupo B e por que preocupa gestantes?
O Streptococcus do grupo B, conhecido cientificamente como Streptococcus agalactiae, é uma bactéria comensal que habita naturalmente o trato gastrointestinal e geniturinário de aproximadamente 30% da população adulta saudável, segundo dados da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Embora geralmente inofensiva para adultos saudáveis, esta bactéria representa séria ameaça para recém-nascidos, podendo causar infecções invasivas como sepse, pneumonia e meningite quando transmitida durante o parto. No Brasil, estima-se que ocorram anualmente 2.500 casos de doença neonatal precoce por GBS, com taxa de mortalidade de 8-10% conforme registros do Ministério da Saúde. A professora Dra. Ana Beatriz Alvarez, infectologista pediátrica da USP, explica: “O sistema imunológico imaturo dos recém-nascidos os torna extremamente vulneráveis a esta bactéria, que pode progredir rapidamente para complicações graves nas primeiras 24 horas de vida”.
Transmissão vertical: como o Streptococcus grupo B atinge os recém-nascidos
A principal via de transmissão do Streptococcus beta hemolítico do grupo B para o recém-nascido ocorre durante o trabalho de parto, quando o bebê entra em contato com secreções vaginais colonizadas. A colonização bacteriana é geralmente assintomática na gestante, o que dificulta o diagnóstico sem triagem específica. Estudos multicêntricos realizados em maternidades brasileiras indicam que aproximadamente 18-25% das gestantes são portadoras da bactéria na região vaginal ou retal, com variações regionais significativas. O risco de transmissão vertical sem profilaxia antibiótica adequada é de 50-60%, sendo que 1-2% desses bebês desenvolvem a forma invasiva da doença. Fatores que aumentam o risco de transmissão incluem:
- Trabalho de parto pré-termo (antes de 37 semanas)
- Ruptura prolongada de membranas amnióticas (superior a 18 horas)
- Febre intraparto materna (superior a 38°C)
- Histórico anterior de filho com doença invasiva por GBS
- Bacteriúria por GBS durante a gestação atual

Doença de início precoce versus doença de início tardio
A manifestação clínica da infecção por Streptococcus beta hemolítico do grupo B no recém-nascido classifica-se em dois tipos principais conforme o tempo de aparecimento dos sintomas. A doença de início precoce ocorre nas primeiras 48-72 horas de vida, representando aproximadamente 80% dos casos no Brasil, com manifestações predominantemente respiratórias e sépticas. Já a doença de início tardio manifesta-se entre a primeira semana e o terceiro mês de vida, frequentemente associada a meningite e com sequelas neurológicas em 25-50% dos sobreviventes, de acordo com dados do Instituto Nacional de Saúde da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz).
Protocolo brasileiro de triagem e prevenção do Streptococcus grupo B
O Ministério da Saúde brasileiro, em consonância com as diretrizes da FEBRASGO, recomenda a triagem universal para colonização por Streptococcus beta hemolítico do grupo B em todas as gestantes entre 35 e 37 semanas de gestação. O exame consiste na coleta de swab simultâneo da região vaginal inferior e retal, seguido de cultura microbiológica em meio seletivo. A sensibilidade deste método é de 90-95% quando realizado adequadamente. No caso de gestantes com fatores de risco específicos, como bacteriúria por GBS diagnosticada durante a gravidez ou histórico de filho anterior com doença invasiva, a profilaxia antibiótica intraparto é recomendada independentemente do resultado da triagem. O protocolo brasileiro estabelece que:
- A triagem deve ser repetida a cada gestação, mesmo com histórico negativo anterior
- Gestantes alérgicas à penicilina recebem esquema alternativo com cefazolina
- Em casos de desconhecimento do status de colonização, a decisão considera presença de fatores de risco
- A antibioticoprofilaxia deve ser iniciada pelo menos 4 horas antes do parto
Diagnóstico laboratorial: métodos para detecção do Streptococcus agalactiae
A cultura microbiológica permanece como padrão-ouro para detecção do Streptococcus beta hemolítico do grupo B, com processamento em meio seletivo como Todd-Hewitt com antibióticos, que aumenta a sensibilidade em 30-50% comparado a meios não seletivos. Recentemente, testes moleculares como PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) têm ganhado espaço por oferecerem resultados rápidos, permitindo triagem durante o trabalho de parto para gestantes não rastreadas. Estudo realizado no Hospital das Clínicas de São Paulo demonstrou sensibilidade de 94,2% e especificidade de 97,8% para PCR intraparto comparado à cultura. Entretanto, especialistas ressaltam que a cultura entre 35-37 semanas mantém vantagem por identificar gestantes colonizadas que podem receber antibioticoprofilaxia planejada, reduzindo emergências. Outros métodos diagnósticos incluem:
- Testes de aglutinação em látex para detecção de antígeno
- Hibridação com sondas de DNA específicas
- Métodos imunocromatográficos rápidos
- Bacteriúria por GBS em exame de urina (considerada colonização maciça)
Abordagem terapêutica: tratamento para gestantes e recém-nascidos
A penicilina G cristalina permanece como antibiótico de escolha para profilaxia intraparto do Streptococcus beta hemolítico do grupo B, administrada por via intravenosa com dose de carga de 5 milhões de unidades, seguida de 2,5-3 milhões de unidades a cada 4 horas até o parto. Para gestantes com alergia à penicilina não anafilática, a cefazolina é a alternativa preferencial, enquanto para alérgicas com risco de anafilaxia recomenda-se teste de sensibilidade e esquema com clindamicina ou vancomicina. O Dr. Roberto Guimarães, membro da Comissão Nacional Especializada em Doenças Infectocontagiosas da FEBRASGO, adverte: “A administração adequada da antibioticoprofilaxia reduz em 80% o risco de doença neonatal precoce, mas não previne a forma tardia da infecção, que requer vigilância contínua”. Para recém-nascidos com suspeita de infecção, o protocolo brasileiro estabelece investigação laboratorial completa e antibioticoterapia empírica com ampicilina + gentamicina até afastamento diagnóstico.
Pesquisas e avanços na prevenção da infecção por GBS no Brasil
Pesquisadores brasileiros têm desenvolvido estudos promissores para o controle do Streptococcus beta hemolítico do grupo B, incluindo investigações sobre vacinas específicas. Cientistas do Instituto Butantan trabalham no desenvolvimento de uma vacina conjugada multissorológica que abranja os principais sorotipos circulantes no Brasil (Ia, Ib, II, III e V). Estudos epidemiológicos coordenados pela Fiocruz identificaram que o sorotipo III é responsável por aproximadamente 60% dos casos de meningite neonatal por GBS no país. Enquanto a vacina não está disponível, estratégias de prevenção baseadas em protocolos de triagem e profilaxia adequados têm mostrado resultados significativos. A implementação do protocolo nacional em maternidades de referência como a Maternidade Escola da UFRJ resultou na redução de 75% na incidência de doença neonatal precoce entre 2015 e 2021, demonstrando a efetividade das diretrizes atuais quando adequadamente aplicadas.
Perguntas Frequentes
P: Todas as gestantes precisam fazer o exame para Streptococcus grupo B?
R: Sim, a FEBRASGO recomenda a triagem universal entre 35-37 semanas para todas as gestantes, mesmo as sem fatores de risco, pois a colonização é frequentemente assintomática e pode ocorrer em qualquer gestante.

P: O parto cesárea eletiva sem trabalho de parto elimina o risco de transmissão?
R: A cesárea eletiva antes do início do trabalho de parto e com membranas íntegras reduz significativamente o risco, mas não o elimina completamente, pois existem relatos raros de transmissão transplacental.
P: O Streptococcus grupo B pode causar problemas na própria gestante?
R: Sim, embora menos comum, a bactéria pode causar infecções urinárias, corioamnionite e infecções pós-parto como endometrite, especialmente em mulheres com condições de imunossupressão.
P: É possível evitar a colonização por GBS durante a gravidez?
R: Não existem métodos comprovados para prevenir a colonização, pois a bactéria faz parte da microbiota normal. A estratégia eficaz baseia-se na detecção e profilaxia adequadas durante o trabalho de parto.
Vigilância contínua: protegendo as próximas gerações
A implementação consistente do protocolo de triagem e profilaxia para Streptococcus beta hemolítico do grupo B representa uma das histórias de maior sucesso na medicina perinatal brasileira contemporânea. Com adesão superior a 85% nas maternidades de referência, temos testemunhado redução progressiva na morbimortalidade neonatal por esta infecção. Contudo, desafios persistem na uniformização do protocolo em todas as regiões do país e no acesso oportuno ao diagnóstico adequado. Gestantes devem ser proativas na solicitação do exame no período recomendado e discutir com seu obstetra o plano de prevenção para o parto. A conscientização, associada aos avanços em pesquisa para desenvolvimento vacinal, aponta para um futuro onde a transmissão vertical do GBS possa ser significativamente controlada, garantindo o direito fundamental à saúde para cada recém-nascido brasileiro.